Sanções comerciais e “Guerra de chips” na indústria de TI  

Para evitar interrupções nas operações, empresas brasileiras e indústrias de TI mantêm estoques de segurança e adiantam a produtividade de um ano. Medida já reflete na escalada dos preços.

Um mundo em processo acelerado de digitalização depende cada vez mais da produção de semicondutores, materiais com propriedades essenciais para fabricação de chips e transistores. Marcando um novo capítulo na história da indústria, o governo dos EUA aprovou no ano passado um investimento de US$ 52,7 bilhões em subsídios para a produção e desenvolvimento de semicondutores.  

O interesse dos norte-americanos em afastar a dependência dos países asiáticos nessa produção virou até tema de negociação na visita do governo brasileiro à Casa Branca, ocorrida em fevereiro desse ano. Enquanto o dinheiro é investido, o estado atual do mercado é de desespero. A oferta de componentes eletrônicos não é a mesma desde as paralisações da pandemia, e segue em baixa com a continuidade da guerra na Ucrânia.  

Como comprova um dos fundadores e CEO da fabricante de nobreaks e estabilizadores, TS Shara, Pedro Al Shara. “Tivemos problemas há dois anos quando o mundo inteiro ficou sem oferta. E hoje nos preocupamos com o que a evolução da guerra ainda pode causar”, alerta o executivo que teme uma escalada dos preços diante da falta de insumos.  

Dependência Externa 

Segundo levantamento do mercado de suprimentos de materiais e tecnologias de dispositivos eletrônicos, até 54% do néon do mundo, parte crítica para os lasers usados ​​nas fábricas de chips, vem de duas empresas ucranianas: Ingas e Cryoin, que passaram por severas interrupções desde a invasão russa.  

Com EUA e Ucrânia de um lado da guerra, e China e Rússia do outro, as cobranças por sanções comerciais começam a chegar aos aliados. A Lei dos Chips, que destravou o investimento norte-americano, por exemplo, condiciona o financiamento a não adesão a qualquer outro negócio envolvendo fabricação ou aumento de capacidade de produção de certos semicondutores na China, pelo prazo de 10 anos.  

De acordo com uma pesquisa da consultoria Gartner, a receita global de semicondutores deve cair 11,2% em 2023, quando em 2022 obteve crescimento marginal de 0,2% em relação ao ano anterior.  

Muito se explica pela política “Covid Zero” adotada pelo governo chinês, que causou interdições na cadeia produtiva, tanto para os semicondutores, como para os produtos finais produzidos na china, celulares e outros eletrônicos, que influenciam na demanda por componentes. A revisão dessa política começou em dezembro do ano passado, e a retomada da China ainda não está efetivada nos mercados globais.  

Provisionamento como garantia de produtividade 

Para não interromper a operação, a TS Shara, que tem fabricação inteiramente nacional e depende desses componentes como insumo para produção de diversos outros produtos, já fez um provisionamento capaz de garantir um ano de capacidade produtiva. “Apesar dos planos, o Brasil ainda não tem fábrica de semicondutores, e cerca de 80% da produção mundial desse componente vital para diversas indústrias está concentrada em Taiwan”, comenta o CEO da TS Shara.   

O executivo espera que, no médio prazo, os investimentos e a competição resultem em um choque positivo na oferta dos componentes. “A China também já prepara um pacote de US$ 143 bilhões para sua indústria de semicondutores. A concentração de produção gera dependência e isso não é benéfico para nenhum mercado”, reforça.  

O presidente da TS Shara faz questão de lembrar que o Brasil é um dos países mais caros para os consumidores finais de eletrônicos. “Um smartphone, por exemplo, pode chegar a custar 74% mais do que nos EUA. E a instabilidade no mercado de um dos componentes mais básicos para a computação vai piorar esse cenário. Com a indústria precisando comprar estoque adiantado, assume-se um risco que deve ser passado ao produto final, alavancando a inflação e distanciando os brasileiros ainda mais da tecnologia”, alerta.  

Indústria tenta driblar falta de chips 

Um dos setores mais afetados pela escassez iniciada na pandemia, a indústria automobilística, busca ativamente alternativas para não interromper sua produção. Segundo a Anfavea, entidade que representa as montadoras instaladas no Brasil, a estimativa é que entre 100 mil e 120 mil veículos deixaram de ser produzidos no país no primeiro semestre de 2021.  

No pico da crise, as montadoras tiveram que escolher quais carros sairiam da fábrica aparelhados, e os produtos com maior valor agregado e rentabilidade, como os SUVs foram prioridade. Isso não quer dizer que os carros populares se tornaram relativamente mais baratos.  

Analistas explicam que com a pandemia e a crise de suprimentos na indústria, principalmente dos semicondutores, o preço dos automóveis disparou muito acima da inflação oficial. Tanto que o carro mais barato no Brasil hoje é vendido por R$ 68.890, acumulando elevação de 137% desde 2017.   

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